Entrei em região
Patagônica atravessando o Golfo Corcovado por 6 horas na embarcação,
de Quellón na Ilha de Chiloé até Chaiten onde
para mim iniciou a Carretera Austral e o visual transformou-se drasticamente
dando lugar a uma exuberante vegetação e enormes montanhas
nevadas, lagos esverdeados e fiordes marítimos. Foram 1384
km em território patagônico até Puerto Natales
passando pela Carretera Austral e pela desolada Ruta 40 na Argentina
onde os ventos alcançam normalmente 140 km/h. Com certeza a
Carretera Austral foi a região mais bonita que passei, com
muitos lugares para acampar, muita água e verde ao redor. As
estradas são todas em rípio de qualidades que vão
de regular a pior, enormes e inclinadas subidas e descidas e uma chuva
fria com ventos fortes que vem a toda hora. A quietude é algo
de melhor, só se escutam os pássaros, o barulho da bike
rodando e as rajadas de vento. A cada meia hora passa um veículo
e os pueblos são pequenos. A comida não é barata
devido ao difícil acesso sendo que no inverno toda esta região
se tranforma num gigantesco campo de gelo. Ventisqueiros, bosques
alpinos, montanhas nevadas, rios de degelo, geleiras e desérticos
pampas ventosos fazem de Patagônia uma das regiões mais
selvagens e bonitas do planeta onde a cada curva uma exuberante e
rica natureza se vislumbra.
Os lugares de interesse são toda a Carretera Austral, O Lago
General Carrera e as Torres del Paine do lado chileno. A Ruta 40,
o Glaciar Perito Moreno e El Chalten, a capital nacional do trekking
com o Monte Fitz Roy no lado argentino.
O clima é mutante. Muita chuva do lado chileno contrasta com
a falta dela no lado argentino.
E há muitas opções para quem gosta de turismo
de aventura.

O
causo das vacas
Entrar no parque Nacional das Torres del Paine
na Patagônia Chilena não é muito barato e tampouco
sai barato acampar lá dentro. Algo que na época e situação
me renderia muitos pratos de comida. Antes de pegar a estrada em Puerto
Natales, encontrei com uma turista alemã que me contou haver
um caminho fora da estrada principal que me levaria até lá
através de umas fazendas, mas eu teria que passar por umas
3 cercas. Tudo bem pensei.
Lá
fui eu pelo tal caminho a fim de economizar minha mixaria. A primeira
cerca estava aberta e passei batido, a segunda não existia,
era apenas um mataburro e lá pelas tantas avistei a terceira
que essa sim provavelmente teria que pular, tirar a coisas da bike
e fazer toda uma função. Que preguiça de fazer
isso, andava cansado, queria chegar duma vez no parque.
Fui pedalando e me aproximei de umas vacas que se assustaram com a
bike e sairam em disparada pro lado da cerca. Eu fiquei ali seguindo
em frente e observando aquele pavor todo. Não é que
quando chegaram na cerca os bichos de tão apavorados ao invés
de correrem para os lados se enfiaram cerca adentro levando tudo embora!
Era vaca se esgoelando e tombando feio no arame que por sorte não
era farpado e eu simplesmente segui em frente sem interromper minha
pedalada.

O causo
do colchão.
Estava eu descansando as margens do lago General Carrera na Patagônia
Chilena após um dia de intenso exercício físico
e muita chuva. Meus tênis estavam molhados e era só o
que eu tinha para usar assim como outras roupas que estavam bastante
úmidas porém salvas pelo anorak impermeável que
costumava usar nesse tempo. O vento pra variar, cada vez mais forte
e eu ali imaginando um lugar bom para dormir e me aquecer a beira
de um fogo.
De repente passa por mim uma Grand Cherokee branca que vi passar por
mim na estrada quando eu pedia carona no meio de mais uma pancada
de chuva numa grande subida de serra beirando as montanhas. Era um
jovem casal de Santiago do Chile cujos nomes logo esqueci e vieram
bater um papo comigo assim como muita gente que me encontarva pela
estrada naquela peculiar situação. Pediram desculpa
por não me dar uma carona pois estavam lotados e eu claro nem
esperava por isso. Me perguntaram as coisas de praxe, quanto peso
carregava, como dormia, pra onde eu ia. Me disseram que ainda teria
muito chão pela frente, coisa que eu ja sabia e me convidaram
para ai até o seu carro pois tinham um presente para mim. Fiquei
curioso. Um presente? Porque? No caminho eles falaram que compraram
mas não usavam e que eu iria gostar.
Chegando no carro o amigo abriu o porta malas e pegou uma caixa um
tanto grande e me entregou. Era um colchão inflável
na cor bordô! Novinho em folha. Nunca tinha sido usado. Mas
era um colchão de casal. Eu na hora recusei, dizendo que não
precisava, que estava acostumado a dormir no chão duro e ja
estava carregando muito peso na bike. Eles insistiram dizendo que
dali pra baixo, para o sul, eu iria precisar pois seria bem mais frio.
Eu então resolvi aceitar até para não fazer disfeita
depois de certa insistência deles e fiquei muito agradecido.
Segui viagem
acrescentando uns 5kg a mais na bagagem e tive que reorganizar algumas
coisas na bike para prender bem o colchão que mesmo sendo novinho,
tive que tirar fora da caixa para prender nos extensores. O meu isolante
foi parar na frente e a cada minuto tinha que empurrar com a mão
pra ele voltar pro lugar. A bike ficou sensivelmente pesada mas eu
não podia fazer mais nada a não ser aproveitar e dormir
no macio dali pra frente.
Encontrei um
lugar bacana a beira de um rio onde pude fazer o meu tão sonhado
fogo que secou parcialmente meus calçados e me aqueceu por
um bom tempo. Resolvi encher o colcão pensando naquela noite
de sono e começei a assoprar. Não havia bomba e segui
soprando. Como estava forte e vigoroso de tanto exercício não
achei tão ruim até perceber que aquilo estava sendo
ridículo. Se eu fosse dormir 3, 5 noites ali tudo bem mas ficar
enchendo colção de casal com a boca todo santo dia era
o fim. Tanto soprei que o colção encheu quase todo.
Chegou ora que já não tinha mais força e resolvi
dormir nele como estava. Foi uma noite do cão. Consegui dormir
mas claro que a cabeça sempreficava mais pra baixo que o resto
do corpo mesmo com minhas roupas sobressalentes servindo de travesseiro.
Resultado. Acordei com a maior dor de cabeça e todo dolorido.
Foi o suficiente pra eu decidir me desfazer daquele colchão
que iria me ajudar dali pra baixo.
Outro dia cheguei em Chile Chico e lá num restaurantezinho
pedi um lomo a lo pobre. Ofereci então o colção
pra mulher que atendia ali depois de me contar que tinha uma pousada.
Queria 10.000 pesos pelo colcão que valia 17,900 pois nele
ainda havia a etiqueta com o preço. Um regalo. Ela aceitou
minha oferta e eu ainda chorei pelo prato de comida, um banho quente
e uma noite acampado no quintal da sua casa. Assim se resolveu a história
do colchão.
2000
- 2012 - Andes no Pedal - andesnopedal@hotmail.com
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